Mais de 700 Turmas Estudam ao Relento em Sofala: Um Desafio Urgente para a Educação Moçambicana

A província de Sofala, no coração de Moçambique, enfrenta uma crise educacional alarmante: mais de 700 turmas estão a estudar ao ar livre, expostas às intempéries e sem infraestrutura adequada. Seis anos após a devastação causada pelo ciclone Idai, em 2019, a lenta reconstrução das escolas deixa milhares de alunos e professores em condições precárias, comprometendo o futuro de uma geração. Este artigo mergulha nas raízes do problema, os esforços em curso e o que está em jogo para a educação na região.

Um Cenário de Adversidade

Em março de 2019, o ciclone Idai assolou o centro de Moçambique, destruindo cerca de 2.700 salas de aula em Sofala. Desde então, outros fenómenos climáticos, como os ciclones Chalane e Eloise, agravaram a situação, danificando ainda mais a infraestrutura escolar. Até o momento, apenas cerca de 1.800 salas foram reabilitadas, deixando um déficit significativo. Escolas como a Primária Completa de Muavi-2, na cidade da Beira, exemplificam o problema: paredes e tetos em risco de colapso forçam alunos a estudar ao relento, enfrentando sol, chuva e distrações que prejudicam o aprendizado.

Mais de 38 mil alunos, a maioria de classes iniciais, iniciaram o ano letivo de 2024 sem salas adequadas, e os números atuais sugerem que a situação não melhorou significativamente. Um recente relatório indica que 700 turmas continuam sem infraestrutura, um reflexo da lenta resposta à reconstrução pós-desastres e da falta de recursos financeiros.

O Impacto nas Comunidades

A precariedade das condições de ensino tem consequências diretas no desempenho escolar. Professores, como José Alfredo, relatam uma “experiência dolorosa e lamentável”. Durante a temporada de chuvas, as aulas são frequentemente interrompidas, forçando alterações no calendário escolar e comprometendo o currículo. “No tempo de chuva, somos obrigados a parar. Isso nos força a alterar o programa estabelecido pelo governo”, desabafa Alfredo.

Encarregados de educação, como Francisco Ndofa e Teresa Francisco, expressam frustração com a inação. “O governo deve priorizar o melhoramento das escolas”, afirma Ndofa. Teresa, mãe de quatro filhos na escola Muavi-2, lamenta: “Desde o Idai, está assim mesmo”. A falta de condições não só desmotiva os alunos, mas também expõe professores e estudantes a riscos físicos, como o colapso de estruturas danificadas.

Esforços e Obstáculos na Reconstrução

As autoridades de Sofala reconhecem o problema, mas apontam dificuldades logísticas e financeiras como entraves. Luís Meno, diretor provincial da Educação, explica que, das 2.700 salas destruídas, cerca de 900 ainda aguardam reconstrução. “Não significa que a escola de Muavi foi esquecida, mas houve outras com danos muito maiores”, justifica. Meno destaca que parcerias com o governo e organizações internacionais estão em curso, como a recente entrega da Escola Secundária de Estoril, reabilitada em 2025.

Além disso, medidas temporárias, como a instalação de tendas escolares, têm sido implementadas. Desde 2019, o governo provincial, com apoio de organizações como a UNICEF, mobilizou recursos para fornecer tendas e materiais básicos, como lonas e quadros. No entanto, essas soluções são insuficientes para atender à magnitude do problema, especialmente em distritos como Beira, Dondo, Nhamatanda, Búzi, Gorongosa e Muanza.

A nível nacional, Moçambique espera arrecadar 69,2 milhões de euros em 2025 com a exploração de Gás Natural Liquefeito (GNL), dos quais 40% serão destinados a um Fundo Soberano que financia projetos de infraestrutura, incluindo 12 novas escolas secundárias. Embora promissor, o impacto desse investimento ainda não chegou a muitas comunidades de Sofala.

Um Chamado à Ação

A situação em Sofala não é isolada. Outras províncias, como Tete e Zambézia, também enfrentam desafios semelhantes, com milhares de alunos estudando ao relento devido à destruição de escolas por desastres naturais e atos de vandalismo. Em Tete, por exemplo, mais de 8 mil alunos estão em condições improvisadas, enquanto na Zambézia, mais de 2 mil turmas enfrentam o mesmo destino.

A crise educacional em Sofala exige uma resposta urgente e coordenada. Investimentos em infraestrutura escolar, parcerias com organizações internacionais e uma gestão mais eficiente dos recursos são passos cruciais. Além disso, a resiliência das comunidades afetadas deve ser apoiada com soluções de longo prazo, como construções resistentes a desastres climáticos, cada vez mais frequentes devido às mudanças climáticas.

Educação como Prioridade Nacional

O direito à educação é um pilar fundamental para o desenvolvimento de qualquer nação, e a situação em Sofala é um lembrete gritante de que Moçambique precisa priorizar suas crianças. A imagem de milhares de alunos estudando sob árvores, expostos ao sol e à chuva, é inaceitável num país que aspira ao progresso. Enquanto o governo e parceiros trabalham para reconstruir, a sociedade civil, organizações não governamentais e a comunidade internacional têm um papel vital em apoiar essas crianças e seus professores.

O futuro de Sofala — e de Moçambique — depende de ações concretas hoje. Que as 700 turmas ao relento sejam não apenas uma estatística, mas um chamado à ação para garantir que cada criança tenha um espaço digno para aprender e sonhar.

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Sobre o autor: Maimuna Carvalho
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