Governo Lula Intensifica Busca por Interlocutor nos EUA para Enfrentar Tarifaço de Trump

Por que o Brasil enfrenta dificuldades para negociar com os Estados Unidos e qual é o caminho para superar o tarifaço de 50%?

Em uma corrida contra o tempo, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) busca um interlocutor ideal nos Estados Unidos para negociar a reversão da tarifa de 50% imposta pelo presidente americano, Donald Trump, sobre as exportações brasileiras, anunciada para entrar em vigor a partir de 1º de agosto de 2025. A medida, considerada uma retaliação política com motivações questionáveis, gerou indignação no Planalto e mobilizou esforços diplomáticos e empresariais para evitar prejuízos econômicos significativos. Com uma relação comercial bilateral de peso, o Brasil enfrenta o desafio de dialogar com uma Casa Branca que parece pouco acessível, enquanto tenta proteger setores-chave como aço, suco de laranja e aviação.

O Contexto do Tarifaço: Política e Economia em Jogo

A decisão de Trump de impor uma sobretaxa de 50% às exportações brasileiras veio acompanhada de uma carta endereçada a Lula, publicada em 9 de julho de 2025 no Truth Social, rede social do presidente americano. No documento, Trump justificou a medida citando supostos “ataques insidiosos” do Brasil contra eleições livres e a liberdade de expressão, além de criticar o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado. O republicano também acusou o Supremo Tribunal Federal (STF) de emitir “ordens secretas e ilegais” contra plataformas digitais americanas, sem apresentar provas.

Lula e sua equipe rebateram as alegações, destacando que os dados oficiais mostram um superávit comercial dos EUA com o Brasil de quase US$ 410 bilhões nos últimos 15 anos, desmentindo a narrativa de Trump sobre um suposto déficit americano. O presidente brasileiro enfatizou a soberania nacional, declarando que “o Brasil não aceitará ser tutelado por ninguém” e que o processo judicial contra Bolsonaro é de competência exclusiva da Justiça brasileira.

A Busca por um Interlocutor Eficaz

O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin (PSB), lidera as negociações e admitiu, em reuniões com empresários, que a interlocução com a Casa Branca é um dos maiores desafios do momento. O governo brasileiro tenta estabelecer pontes com o Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR), mas a falta de resposta a propostas enviadas, como a minuta confidencial de maio de 2025, tem frustrado as articulações.

Uma iniciativa paralela do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), de priorizar a Embaixada dos EUA, foi vista como positiva, mas limitada, já que o contato se dá com um encarregado de negócios, figura de menor hierarquia no Departamento de Estado. O Planalto, por sua vez, aposta em uma abordagem mais ampla, envolvendo setores empresariais e entidades bilaterais, como a Câmara Americana de Comércio (Amcham Brasil), para pressionar por negociações.

Estratégias Brasileiras: Diplomacia, Reciprocidade e OMC

O governo Lula adota uma estratégia multifacetada para enfrentar o tarifaço:

  1. Diplomacia Ativa: Uma carta assinada por Alckmin e pelo chanceler Mauro Vieira foi enviada em 15 de julho de 2025 ao secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, e ao representante comercial, Jamieson Greer, expressando indignação com a tarifa e cobrando respostas às propostas brasileiras. O documento reitera a disposição para negociar uma solução “mutuamente aceitável” e destaca o impacto negativo da medida nas economias de ambos os países.
  2. Lei da Reciprocidade Econômica: Sancionada em abril de 2025, a lei permite ao Brasil retaliar países que imponham barreiras comerciais unilaterais. Lula regulamentou a norma por decreto, criando um comitê interministerial com representantes da Casa Civil, Fazenda, Relações Exteriores e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, além de empresários. O presidente afirmou que, caso as negociações falhem, o Brasil poderá impor tarifas de 50% sobre produtos americanos, como uma resposta proporcional.
  3. Recurso à OMC: Lula planeja articular com outros países taxados pelos EUA, como Japão e Coreia do Sul, para levar o caso à Organização Mundial do Comércio (OMC). No entanto, a entidade enfrenta esvaziamento, o que reduz as expectativas de uma solução rápida.
  4. Engajamento Empresarial: Reuniões com setores industriais (aço, aviação, celulose) e do agronegócio (carne, suco de laranja, café) foram marcadas para discutir impactos e estratégias. Alckmin destacou que o tarifaço também prejudica empresas americanas que dependem de insumos brasileiros, como aço e autopeças. O governo busca unir o setor privado em defesa dos interesses nacionais, com Lula apelando para o “orgulho de ser brasileiro”.

Impactos Econômicos e Setores Ameaçados

Os EUA são o segundo maior destino das exportações brasileiras, atrás da China, com US$ 16,7 bilhões em vendas nos primeiros cinco meses de 2025, segundo a Amcham Brasil. Setores como aço, petróleo, aeronaves (Embraer), celulose, café, carne e suco de laranja são os mais vulneráveis à tarifa de 50%, que representa um salto em relação aos 10% aplicados em abril. Empresários já estimam perdas e buscam novos mercados, enquanto o governo promete apoio para diversificar parcerias comerciais.

A medida de Trump é vista por diplomatas e analistas como uma sanção punitiva com motivações políticas, mais do que uma política comercial. O ex-chanceler Aloysio Nunes classificou a ação como “coisa de gangster”, destacando que não há justificativa comercial para a tarifa. O economista Paul Krugman, Nobel de Economia, descreveu a política tarifária de Trump como “megalomaníaca”.

O Papel de Bolsonaro e a Tensão Política

A menção de Trump a Jair Bolsonaro na carta intensificou o embate político. Lula atribuiu a tarifa às articulações do ex-presidente e de seu filho, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que se mudou para os EUA em março de 2025 para pressionar por anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro e sanções contra o ministro do STF Alexandre de Moraes. O governo Lula usa a narrativa de soberania para associar Trump e Bolsonaro a interesses contrários ao Brasil, enquanto busca apoio de empresários e da sociedade para reforçar sua posição.

Perspectivas: Negociação ou Confronto?

Apesar da retórica firme, o governo Lula prioriza a via diplomática, com Alckmin liderando esforços para dialogar com o USTR e entidades americanas. A falta de resposta de Washington, no entanto, aumenta a pressão para medidas de retaliação, que podem incluir tarifas sobre produtos americanos como eletrônicos, automóveis e trigo. A criação do comitê com empresários e a regulamentação da Lei da Reciprocidade sinalizam que o Brasil está preparado para escalar a resposta, caso necessário.

Lula também aposta em uma ofensiva de comunicação, com ações como o artigo do ministro Jorge Messias no The New York Times, criticando o tarifaço como pressão política. A estratégia busca expor as contradições de Trump e mobilizar apoio internacional, enquanto o Brasil reforça sua imagem de nação soberana que não cederá a pressões externas.

Um Momento Crítico para o Brasil

O tarifaço de Trump representa um desafio econômico e político sem precedentes para o governo Lula. A busca por um interlocutor eficaz nos EUA é apenas o primeiro passo em uma negociação complexa, que exige equilíbrio entre diplomacia, firmeza e mobilização interna. Enquanto o Brasil tenta evitar um confronto comercial com seu segundo maior parceiro, a mensagem é clara: a soberania nacional e os interesses econômicos do país não estão à venda.

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Sobre o autor: Maimuna Carvalho
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