Em um movimento que reacendeu debates sobre a liberdade de expressão e a independência judicial em Angola, o Tribunal da Relação de Luanda ordenou a suspensão do “Diálogo Nacional sobre o Processo Legislativo Eleitoral”, um evento organizado pela Ordem dos Advogados de Angola (OAA). Marcado para 8 de maio de 2025, na Universidade Católica de Angola, o encontro reuniria juristas, ativistas e especialistas para discutir o controverso pacote legislativo eleitoral proposto pelo governo. A decisão judicial, tomada após uma providência cautelar movida por um grupo de advogados, foi classificada pela OAA como “um atentado contra liberdades fundamentais” e levou a instituição a anunciar uma queixa-crime contra o juiz responsável.
O diálogo suspenso tinha como objetivo promover uma análise jurídica e técnica do pacote eleitoral, que inclui artigos criticados por oposição e sociedade civil por possíveis riscos à transparência nas próximas eleições. Entre os oradores estavam nomes de peso, como o ativista Luaty Beirão, o ex-bastonário da OAA Luís Monteiro, o jornalista Reginaldo Silva e o especialista em sistemas eleitorais Luís Gimbo. A OAA enfatizou que o evento não visava interferir nas competências legislativas do Parlamento, mas sim fomentar um “debate plural” sobre um tema de relevância nacional.
A suspensão ocorreu em um momento delicado, coincidindo com o início das discussões parlamentares sobre o mesmo pacote eleitoral. Para críticos, a decisão judicial reflete uma tentativa de silenciar vozes dissidentes em um contexto de crescente fragilidade política do regime angolano.
Em comunicado assinado pelo bastonário José Luís Domingos, a OAA classificou a decisão como “uma agressão direta à autonomia institucional” e prometeu usar todos os meios legais para defendê-la. A instituição planeja apresentar uma queixa-crime contra o juiz relator, alegando violação dos deveres de imparcialidade e respeito aos limites constitucionais. Além disso, a OAA anunciou que recorrerá ao Tribunal Constitucional para contestar a suspensão, reforçando seu compromisso com as liberdades fundamentais e o Estado de Direito.
“O pensamento crítico não é um ato subversivo; é um ato republicano”, afirmou a OAA no comunicado, destacando a importância de proteger o espaço cívico e democrático.
A decisão judicial gerou uma onda de críticas de ativistas, juristas e políticos. Luaty Beirão, conhecido por seu ativismo e participação em protestos pró-democracia, questionou a celeridade do processo judicial, sugerindo que o sistema é manipulado para proteger o regime. “Funcionam com muita celeridade quando é para escudar o regime”, declarou, apontando para a perda de credibilidade do governo.
O jurista Jaime Domingos foi ainda mais enfático, afirmando que a decisão marca um ponto de ruptura. “Este país acabou, a partir de hoje, depois desta decisão contra um exercício de cidadania”, disse, chamando os angolanos a refletirem sobre o futuro da nação.
Muata Sebastião, do Bloco Democrático, foi além, defendendo a necessidade de uma “nova revolução” para refundar o Estado angolano com base em um novo contrato social. “O que vemos hoje é a subversão”, alertou, criticando a priorização de interesses de grupo sobre o bem comum.
A União dos Advogados de Língua Portuguesa também se manifestou, classificando a suspensão como “um grave sintoma de recuo democrático” e uma violação da autonomia da OAA.
A suspensão do debate expõe tensões profundas no sistema político angolano, onde o Judiciário é frequentemente acusado de agir em favor do governo. A OAA, como instituição independente, desempenha um papel crucial na promoção do debate público e na defesa do Estado de Direito. A tentativa de limitar sua atuação levanta preocupações sobre o espaço para o dissenso e a participação cívica em Angola.
Enquanto a OAA prepara sua resposta legal, o caso já mobiliza a sociedade civil e reacende discussões sobre a necessidade de reformas estruturais. Para muitos, a decisão judicial não é apenas um ataque à liberdade de expressão, mas um reflexo de um sistema que teme o diálogo aberto e plural.
Com a queixa-crime e o recurso ao Tribunal Constitucional, a OAA sinaliza que não recuará. O desfecho do caso pode ter implicações significativas para a independência das instituições angolanas e para o futuro da democracia no país. Enquanto isso, a sociedade civil permanece atenta, exigindo transparência e respeito aos direitos constitucionais.
Para os leitores da Origamy Inc., este episódio serve como um lembrete da importância de proteger as liberdades democráticas e de apoiar instituições que lutam por um futuro mais justo. A história está em aberto, mas uma coisa é certa: em Angola, o diálogo, mesmo silenciado, continua a ecoar.